VISTOS. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO ajuizou AÇÃO CIVIL PÚBLICA em face de ANTONIO LOURO, HELIANA ANTONIETTE, ESTADO DE SÃO PAULO E PREFEITURA MUNICIPAL DE SANTA ISABEL, alegando, em resumo, que os réus Antonio e Heliana executaram parcelamento do solo, para fins urbanos, sem registro imobiliário, alienando lotes, em imóvel situado na Estradsa SP 56, km 70,5, bairro Pouso Alegre, Santa Isabel, bacia Hidrográfica do Rio Paraíba – Represa do Rio Jaguari, em área de proteção aos mananciais hídricos, sem aprovação do município da Santa Isabel e prévia anuência dos órgãos do governo estadual, agindo, desse modo, em desacordo com as normas da Lei Federal nº 6.766/79. Aduz, ainda, que houve omissão por parte da Fazenda Estadual e da Municipalidade, que não tomaram qualquer medida concreta que fosse capaz de impedir a ocupação. Requer a condenação dos réus, solidariamente, na obrigação de proceder ao necessário para a regularização do loteamento, em prazo não superior a dois anos, além de indenizar os danos urbanísticos e ambientais ocasionados pela execução do desmembramento, em motante a ser apurado em liquidação. Alternativamente, em não sendo possível a regularização do loteamento, pugnou pela condenação dos requeridos à reparação dos danos ambientais e urbanísticos por meio do desfazimento do parcelamento e restauração da gleba ao estado original, bem como ao pagamento de indenização pelos prejuízos eventualmente suportados pelos adquirentes dos lotes, substituindo os lotes negociados por outros em situação regular ou ressarcindo as quantias pagas (fls. 02/28). Citados, os réus Antonio e Heliana ofereceram contestação (fls. 1.046/1.058), requerendo, preliminarmente, a extinção do processo sem julgamento do mérito, sob o argumento de que o Condomíno esteve regular e produziu efeitos jurídicos válidos segundo a legislação vigente à época, não se aplicando ao caso as Leis 6.766/79 e 8.078/90. No mérito, sustentam não serem responsáveis pela irregularidade do loteamento, atribuindo a culpa ao CRI, aos co-proprietários e síndicos do empreendimento. Alegam, ainda, que Município e o Estado foram omissos em seu dever de fiscalizar, o que teria feito acreditarem na regularidade do empreendimento. Por fim, sustentam que eventual regularização do empreedimento, deve ser feita em conformidade com os Dec.-Lei 58/1937 e 271/1967 e a Lei 4.591/1964. O Estado de São Paulo, por sua vez, arguiu, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, sob o argumento de que caberia ao Município o dever de fiscalizar o parcelamento do solo urbano. No mérito, sustenta que não foi omisso em seu dever de fiscalizar, pugnando pela improcedência do pedido (fls. 1214/1237). Por fim, a Prefeitura Municipal de Santa Isabel, ofereceu contestação, requerendo, preliminarmente, a extinção da ação sem julgamento do mérito, arguindo a ilegitimidade ativa do Ministério Público para a propositura da presente ação, a inadequação da via eleita, bem como sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda. No mérito, pugna pela improcedência do pedido, sob o argumento de que não teria qualquer responsabilidade pelos fatos descritos. Sustenta, ainda, a prescrição da pretesnão indenizatória. Por fim, requer que seja celebrado compromisso de ajustamento de conduta, com assunção de obrigações pelos loteadores. (fls. 1199/1209). O autor se manifestou a respeito das contestações (fls. 1.686/1691). É o relatório. DECIDO. As questões suscitadas nestes autos constituem matéria a desnecessitar de produção de outras provas em audiência, motivo pelo qual se conhece diretamente do pedido. Por primeiro, cumpre observar a legitimidade do Ministério Público para a propositura da ação. O artigo 129 da Constituição Federal legitima o Ministério Público a promover ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, dentre eles, o urbanístico. Da mesma forma, a Lei da Ação Civil Pública em seu art. 5º prevê a legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento de ação de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e paisagístico, bem como a atuação como custus legis nas ações civis públicas em que não intervir como parte. A presente ação civil pública visa, primordialmente, à tutela da ordem urbanística, portanto do meio ambiente, uma vez que a demanda busca a condenação dos requeridos a regularizarem o loteamento, realizando as obras de infraestrutura necessárias, bem como providenciar a aprovação do loteamento e o regular registro no CRI. Assim, nitidamente, a pretensão tem caráter difuso, passível da atuação ministerial, o que, aliás, já resta sedimentado na jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça: "O Ministério Público tem legitimidade ativa para propor ação civil pública visando à regularização de loteamentos urbanos destinados à moradia popular" (REsp 601981/SP, rel. Ministra Eliana Calmon); "O Ministério Público é parte legítima para a defesa dos interesses dos compradores de imóveis loteados, em razão de projetos de parcelamento de solo urbano, face a inadimplência do parcelador na execução de obras de infraestrutura ou na formalização e regularização dos loteamentos" (REsp 137.889/SP, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, j .06.04.2000). "O Ministério Público é parte legítima para propor Ação Civil Pública para discutir a regularização de loteamento relacionada ao desenvolvimento urbano, pois neste caso trata-se de interesses difusos e coletivos não referentes a pessoas determinadas e sobre bens não disponíveis. É dever constitucional do Ministério Público a defesa do patrimônio público e social, dos interesses difusos e coletivos e de outras funções compatíveis com a sua natureza (art. 129, III e IX CF)" (REsp 436166/SP, rel. Min. José Delgado). Dessa forma, patente está a adequação do meio processual eleito, tendo o Ministério Público legitimidade para a propositura da ação que visa à regularização do loteamento e reparação do dano ambiental causado. Também não prevalece a preliminar suscitada de ilegitimidade passiva da Municipalidade e da Fazenda Estadual. Considerando que o controle, o parcelamento e a ocupação do solo urbano são encargos, por excelência, do Município (artigo 30, VIII, da CF) e tendo em conta a razoabilidade de se evitar a expansão de possíveis irregularidades, impunha-se que procedesse à fiscalização do local, de molde a se impedir o loteamento. Da mesma forma, cabe ao Estado o dever solidário de defender e preservar o meio ambiente, assim, como o de fiscalizar as normas do uso do solo em área metropolitanas, área onde se situa o loteamento em tela. Ademais, considerando que o loteamento em questão está inserido em área de proteção de mananciais e de proteção ambiental, também a ele competia o dever de fiscalizar o que se passava, por meio de seus órgãos, entre eles CETESB, Secretaria do Meio Ambiente do Estado, DPRN e do GRAPOHAB. Assim, como tanto a Municipalidade como a Fazenda Estadual tinham o dever de fiscalizar a atividade irregular noticiada na inicial, ambas são legitimadas para reponder à presente ação, sendo questão de mérito a ocorrência ou não de eventual omissão deste dever. Da mesma forma, não há que se falar em ato jurídico perfeito, coisa julgada ou direito adquirido, como arguido pelo requeridos. Nunca houve ação, muito menos decisão transitada em julgado envolvendo o dever de regularizar o loteamento em questão. Ademais, como bem elucidado pela I. Promotora de Justiça, as condutas praticadas pelos requeridos no período por eles mencionado (fevereiro de 1979 a junho de 1986) contrariavam a legislação vigente à época e, diante da ocupação irregular e desordenada, continuam produzindo reflexos danosos ao meio ambiente no tempo, encontrando-se até os dias atuais em desconformidade com a legislação vigente, como veremos adiante. Inocorre, ainda, a alegada prescrição, pois como bem observado pela ilustre representante ministerial, a presente ação civil pública busca a proteção de direitos transindividuais, absolutamente indisponíveis, não se submetendo, dada sua natureza, às regras da prescrição, até para fins de se evitar prolongação de violação da ordem urbanística e degradação ambiental. Superadas as preliminares, no mérito a ação é procedente. Trata-se de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo visando à regularização do loteamento denominado "Condomínio Santa Isabel", localizado em área de proteção aos mananciais híbridos, e a conseqüente recuperação ambiental da área, além da indenização pelos danos ambientais e urbanísticos causados. As provas acostadas evidenciam que os loteadores/requeridos teriam executado parcelamento do solo em imóvel de sua propriedade, situado na Estrada SP 56, km 70,5, bairro Pouso Alegre, Santa Isabel, bacia Hidrográfica do Rio Paraíba – Represa do Rio Jaguari, em área de proteção aos mananciais hídricos, com aproximadamente 334.486,87m², dividindo a gleba em 258 frações. Os próprios loteadores não contestam o alegado parcelamento do solo, no entato, insistem no argumento de que teriam instituído um condomínio horizontal, com fundamento na Lei 4.591/64, argumentando que providenciaram em 16 de fevereiro de 1979 o registro de escritura pública de convenção e instituição de condomínio junto à matrícula do imóvel (documeneto de fls. 1147/1151), registro que, segundo eles, teria sido cancelado “por erros e anamolias/registrárias”. Sustentam, assim, que se faz necessária apenas a regularização do registro do condomínio em conformidade com a Lei 4.591/64, não sendo aplicável ao caso as exigências da Lei 6.766/79 e que teriam atendido a todas as exigências legais. A versão dos loteadores, no entanto, não subsiste. De fato, não se olvida que na época dos fatos (16/02/1979) os requeridos providenciaram o registro de escritura pública de convenção e instituição de condomínio junto à matrícula do imóvel (documeneto de fls. 1147/1151). Ocorre, entretanto, que referida escritura, diversamente do que sustentado pelos requeridos, não instituia um condomínio em conformidade com a Lei 4.591/64, mas sim fazia referência a um “condomínio ordinário e perpétuo pelo regime tradicional do Código Civil Brasileiro, com as inovações acrescidas pela evolução do nosso Direito”, por mieo do qual seriam alienadas frações ideais do imóvel de sua propriedade, conforme se depreende da leitura do documento de fls. 1147/1151, condomínio este que não guarda qualquer relação com o parcelamento do solo ou mesmo com a instituição de condomínio especial horizontal, e que prescinde de registro. Exatamente porque não havia e não há qualquer previsão legal para o registro de condomínio tradicional da forma como fora feito, o qual, como já dito, não se confunde com o condomínio especial horizontal tratado pela Lei 4.591/64, em 1986, por decisão da E. Corregedoria Geral da Justiça, referido registro foi cancelado (fls. 503/507). Na ocasião, a própria E. Corregedoria Geral de Justiça constatou que no local, sob a roupagem registrária de um condomínio, Antonio e Heliana teriam instituído verdadeiro loteamento clandestino no imóvel. É inquestionável, portanto, que os loteadores promoveram o parcelamento do solo, alienando os lotes mediante promessas de venda, por instrumentos particulares de compromisso de compra e venda, sem a regularização do registro do desmembramento, contrariando o artigo, 37 da Lei 6.766/70, vendas estas feitas dirtamente pelo requerido Antonio Louro, conforme contratos juntados aos autos. Não assiste razão aos requeridos no tocante à tese do caráter de condomínio horizontal do empreendimento. Os documentos e provas trazidos aos autos são conclusivos ao indicar a tentativa de burla às cautelas da Lei 6.766/79. Como já dito, embora os primeiros requeridos sustentem que apenas realizaram a implantação de um condomínio especial horizontal de casas, ao abrigo da Lei n° 4.591/64, a documentação e a situação fática dos autos espelham nítida implantação de um loteamento. Com efeito, os corréus adquiriram a gleba localizada no Município de Santa Isabel e, sem obedecer a quaisquer formalidades, realizaram seu desmembramento em 258 lotes, alienando tais frações a diversos adquirentes. A modalidade de condomínio especial horizontal exige atendimento de uma série de regras dispostas na lei de regência, as quais nunca foram observadas. A análise empreendida permite concluir que o condomínio horizontal previsto na Lei n° 4.591/64 é de casas térreas ou assobradas, não admitindo mera alienação de lotes de terrenos. Caso realmente se tratasse de condomínio horizontal, os corréus deveriam ter atendido ao artigo 32 da Lei n° 4.591/64, que exige do empreendedor apresentar previamente, para registro, o projeto de construção aprovado, indicando a área a ser edificada e a área comum, isto para cada tipo de unidade autônoma. E somente após isso estaria autorizado a negociar as unidades autônomas. E isso não ocorreu. Portanto, embora até pudesse ser a vontade dos requeridos a instituição de um condomínio especial horizontal de casas ao abrigo da Lei n°4.591/64, na realidade empreenderam um loteamento irregular. Assim, não há como negar que de qualquer ângulo que se observe a questão, a responsabilidade dos réus/lotadores é evidente, vez que houve infração não só do regime jurídico da Lei 6.766/79 (art. 37), como da Lei 4.591/64 (art. 32). A conduta dos corréus, portanto, constitui ilícito civil, além de violar o Código de Defesa do Consumidor, sendo dever deles regularizar o loteamento para que os adquirentes possam exercer seu direito de proprietários na plenitude, bem como reparar todo o dano ambiental e urbanístico causado. É bom salientar, neste ponto, que além de instituirem loteamento sem atender as formalidades da Lei 6.766/79, o parcelamento também foi executado com desprezo à Lei Estadual n. 1.172 de 17/11/1976, por situar-se em área de proteção ambiental permanente. Segundo o laudo de fls. 419/436 e informações do Departamento de Uso do Solo Metropolitano (fls. 868), o loteamento operou-se em área de 2ª categoria, classe “C”, com incidência de áreas de 1ª categoria, situação que permite apenas lotes com superfície de 6.432 m². Assim, também evidente que houve infração ao artigo 16, inciso II, da Lei 1.172/76, quanto á área dos lotes, que possuem 600m², e à densidade admitida, o que torna inquestionável a ocorrência de dano ambiental, cujo valor de indenização deve ser apurado em liquidação. Mas não é só. Os documentos juntados também dão conta de que a coleta de esgoto opera-se através de fossa negra, com violaçao ao artigo 24 da Lei 1.172/76, por não ter sido implantado sistema de fossa séptica ou poço absorvente. Ademais, o empreendimento não apresenta nenhum tipo de prevenção de controle de erosão, além de ter havido o desmatamento e cortes no terreno para a implantanção dos lotes, deixando-se o solo exposto, com violação ao disposto no artigo 20 da Lei 1.172/76, quanto à proteção dos corpos d’água contra assoreamento e erosão. Neste ponto, é bom destacar que ainda que os loteadores não sejam os causadores diretos de todos os ilícitos acima apontados, em tendo realizado o parcelamento do solo sem a observância das exigêncais legais, cabe a eles a regularização do empreendimento, devendo tomar todas as medidas necessárias para tanto. Ademais, também repondem por todos os danos urbanísticos e ambientais causados, vez que são os proprietários da área, nada obstante possam em ação própria buscar a ressarcimento de eventual causador direto. Pois bem, em tendo ficado demonstrado, conforme acima exposto, que ocorreu um desmembramento irregular do terreno, de rigor a procedência dos pedidos quanto aos réus responsáveis pelo loteamento irregular, aos quais impõe o dever de tomar todas as medidas necessárias para a regularização do emrpeendimento, bem como reparar os danos urbanísticos e ambientais causados, cujo valor deve ser apurado em liquidação. Considerando que até o momento não houve a regularização do empreendimeto, esta deve ser feita com a observância da legislação atualmente vigente, ou seja, da época da regularização, dentro do prazo de dois anos, sob pena de multa, até porque, ainda que o loteamento aqui denominado Condomínio Santa Isabel tenha sido instituído antes do advento da Lei 6.766/79, dado o caráter instrumental do aludido diploma legal sua aplicação é imediata, “tanto para os parcelamentos ilegais implantados após tal lei, quando para os implantados antes dela” (RT 618/78; RJTJESP 120/210), Por outro lado, em não sendo possível a regularização, cabe aos loteadores a reparação dos danos ambientais e urbanísticos por meio do desfazimento do parcelamento e restauração da gleba ao estado original, bem como ao pagamento de indenização pelos prejuízos eventualmente suportados pelos adquirentes dos lotes, substituindo os lotes negociados por outros em situação regular ou ressarcindo as quantias pagas. Já quanto à responsabilidade solidária da Municipalidade e da Fazenda Estadual em promover a regularização do loteamento, está também é evidente, senão vejamos. Como já exposto quando da análise da preliminar de ilegitimidade passiva, tanto a Municipalidade quanto a Fazenda Estadual tinham o dever de fiscalizar o local, de modo a impedir o loteamento, diante do dever solidário de todos os entes da Federação em promover a defesa e preservação do meio ambiente, e mais especificamente do dever do Município de promover o adequado e regular ordenamento urbano e manter o padrão urbanístico, bem como o dever da fazenda Estadual de fiscalizar as normas do uso do solo em área metropolitanas. E, neste ponto, ambos os requeridos foram omissos, pois a partir da emissão de ato autorizativo para a implantação do loteamento por parte do Município (fls. 545) e do Estado, através da CETESB (fls. 546), incumbiria ao Poder Público a continuidade na prestação de serviços de controle e fiscalização, de modo a possibilitar a verificação, por exemplo, do atendimento dos padrões urbanísticos, de danos ao meio ambiente e ao patrimônio público, assim como dos eventuais danos ao ente coletivo e aos mais altos interesses sociais, o que no presente caso não houve. Mas não é só. Se não bastasse tal omissão, no presente caso referidas autorizações foram dadas ao arrepio da Lei Estadual n. 1.172 de 17/11/1976, pois, conforme informações do Departamento de Uso do Solo Metropolitano (fls. 868), ao situar-se em érea de proteção ambiental, já que o loteamento operou-se em área de 2ª categoria, classe “C”, com incidência de áreas de 1ª categoria, somente seria permitido lotes com superfície mínima de 6.432 m², tendo sido autorizado pelo poder Público o parcelamento da área em glebas de 600 m². Assim, no presente caso, não apenas houve omissão por parte do Poder Público Municipal e Estadual em seu dever de fiscalizar o loteamento, como também conduta comissiva por parte de tais entes, na medida em que expediram autorizações para a implantação do loteamento em desacordo com a legislação vigente, o que evidentemente contribuiu de alguma forma para a expansão do loteamento, já que tais autorizações podem ter contribuído para que os adquirentes acreditassem que o parcelamento estivesse regular aumentando, assim, as vendas e, consequentemente, a ocupação irregular. Desse modo, deve ser reconhecida a presença do direito público subjetivo afirmado pelo autor na petição inicial com relação ao dever do Poder Público Municipal e Estadual, por ter omitido a fiscalização da ocupação irregular do solo, os quais devem responder solidariamente com os loteadores. Por todo o exposto, tem-se que na divisão do imóvel mencionado na inicial, falharam os proprietários, que realizaram desmembramento irregular, falhou o Poder Público Municipal e Estadual, que deixaram de exercer o controle que lhes cabia, o que impõe a procedência dos pedidos em sua integralidade. Por fim, ressalto que não prevalece a alegação de que contra a Fazenda Pública descabe aplicação de multa diária pelo descumprimento das obrigações impostas, porque consoante dispõe o artigo 644, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe deu a Lei n° 10.444/02, que "a sentença relativa a obrigação de fazer ou não fazer cumpre-se de acordo com o art. 461, observando-se, subsidiariamente, o disposto neste Capítulo". E o artigo 461, § 4º, do mesmo Códex, que prevê a aplicabilidade da multa diária nos casos de descumprimento das determinações judiciais, não ressalta a inaplicabilidade das astreintes às Fazendas Públicas. Tal entendimento se justifica porque embora o interesse da coletividade, na esfera administrativa, prevaleça sobre o interesse privado, a verdade é que a Fazenda, quando litiga em Juízo, assemelha-se ao particular, e sob tal condição também pode ser compelida deste modo a realizar a obrigação. Nesse sentido: "Ação civil pública - Loteamento clandestino - Irregularidade - Responsabilidade objetiva e subjetiva da Municipalidade e litisconsorte - Obrigação de não fazer e obrigação de fazer - Imposição - Multa diária - Legalidade - Sentença de procedência parcial confirmada - Recursos não providos" (Apelação Cível n° 233.160-5/2 - São Paulo - 4o Câmara de Direito Público – Relator Soares Lima - 24.06.04 - VU). Isto posto, e o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE os pedidos do autor, para condenar os réus, solidariamente, a providenciarem a regularização do loteamento, no prazo de dois anos, a contar do trânsito em julgado, nos termos do item “a” e subitens da inicial (fls. 25/26), sob pena de multa equivalente a dois salários mínimos da época por dia de atraso. O valor deverá ser recolhido mês a mês ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados, em conta corrente indicada na inicial. Caso não seja possível a regularização, condeno os requeridos, solidariamente, a restabelecer a área ao estado anterior e substituir os lotes negociados com os adquirentes por outros imóveis do mesmo valor ou indenizá-los pelas quantias porventura pagas e indenizá-los por perdas e danos, valor a ser apurado em liquidação por artigos. Sem prejuízo, condeno os requeridos, também solidariamente, a indenizarem os danos urbanísticos e ambientais causados pela implantação do loteamento, conforme apurado em execução. Em consequência JULGO EXTINTO o processo, com julgamento do mérito, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil. Condeno os réus no pagamento de custas e despesas processuais, corrigidas a partir de seu desembolso. Inviável a condenação dos réus no pagamento de honorários advocatícios visto que não ocorreu dispêndio pela parte e não pode o Ministério Público perceber remuneração por sua atuação. Neste sentido: “HONORÁRIOS DE ADVOGADO - Ação civil pública - Inadmissibilidade - Ministério Público que não pode perceber qualquer remuneração quando exerce um munus público - Artigo 127, § 5º, II, letra "a" da Constituição da República - Vedação constitucional que não dá margem à qualquer interpretação permissiva da incidência de verba honorária - Recurso não provido. O Ministério Público, assim como a Magistratura, não pode, sob nenhum pretexto, perceber qualquer remuneração nos processos em que exerce o munus público, segundo emerge do artigo 127, § 5º, II, letra "a", da Constituição da República.” (TJSP - Ap. Cível nº 215.547-1 - Jacupiranga - CCIV 8 - Rel. Felipe Ferreira - J. 23.11.94 - v.u.). P.R.I.C. Santa Isabel, 15 de agosto de 2012. PRISCILA DEVECHI FERRAZ MAIA Juíza de Direito
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